sábado, 28 de abril de 2018

'Amor de verdade': Como MC Kekel e MC Rita levaram o funk romântico de volta ao 1º lugar no Brasil


Eu estava batucando no armário", conta Keldson William da Silva, 22 anos, sobre um vídeo gravado no começo de 2016. Na época, a música que ele cantou ganhou o nome "Espera aí". "Eu nem sabia bem a letra, só fui batendo e cantando", conta.
Mais de dois anos depois, a música que ele compôs é a mais tocada no Spotify e no YouTube no Brasil. Veja no vídeo acima acima como 'Amor de verdade' chegou ao topo. Abaixo, conheça Keldson, o MC Kekel, e sua colega na música, MC Rita.

Quem é MC Kekel?

Não é fácil responder, mesmo após conversar com ele. Kekel é daquelas pessoas que têm várias ideias por segundo. Ele diz ter duas personalidades artísticas: um se chama Mandella, está solteiro e canta letras ousadas. O outro se chama Kekel mesmo, noivo e romântico.
"Eu sou um compositor meio maluco", se define o artista de Guaianazes, Zona Leste de SP.
"Amor de verdade" incorpora esse "lado Kekel", com juras de amor puro. Mas ele já teve hits com o tal alter ego "solteiro Mandella", como "Meiota" ("Quer andar de meiota? Senta aqui na minha pir**a"), ou a faixa com o nome do personagem,"Mandella é meu nome"
Nos últimos anos, o que pegou mesmo no funk de SP foram versos do tipo "sentar na meiota" mesmo. Ele não tinha muita pretensão lá em 2016 com o vídeo batucando e jurando amor. Mesmo assim, mandou a um amigo poderoso: o DJ Perera. Ele postou no Facebook e os "views" vieram.
"Amor de verdade" não tem uma musa específica. "Na época eu era solteiro, não tinha nenhum amor no coração não", diz o cantor, hoje casado.
"O vídeo viralizou e muita gente pediu para eu gravar essa música no estúdio. Cheguei a gravar com o DJ Yuri Martins umas três vezes, mas não saía", conta Kekel. A música era cantada nos shows e já conhecida no circuito de funk pelo vídeo caseiro, mas demorou a ganhar produção de verdade.

E a MC Rita?

A coisa começou a se amarrar com outro vídeo de uma menina de 17 anos, que começou a cantar na igreja. Ela fez sua versão, igualmente caseira, da tal música que tinha viralizado no Facebook do DJ Perera. "Eu vi a MC Rita fazendo a cover e resolvi insistir", diz o MC.
"Fiz o vídeo porque sempre fui fã dele, e ainda sou. Aí ele chamou para gravar. O Kekel veio como um anjo na minha vida", diz Rita.
Kekel chamou a jovem de São Vicente (SP), para o estúdio com o DJ RD (que também tem outra faixa em alta nas paradas hoje:"Só quer vrau", paródia da canção italiana da trilha da série "La casa de papel"). Foi RD que deu a forma final, dois anos depois, a "Amor de verdade".
Não foi só questão de achar as pessoas certas. Foi a hora certa: o funk de SP tem cada vez mais espaço para o romantismo. Outro hit atual é "Tem café", com Gaab e Hariel, também melodiosa, mas ainda com espaço para a letra picante. "Amor de verdade" fica só com o romantismo mesmo, sem palavrão.
"O funk tem seus momentos. Já teve época de todo mundo revoltado, todo mundo solteiro. Em 2016 o funk melody não estava em alta, era mais a putaria mesmo. E agora o romantismo pegou todo mundo de surpresa", explica Kekel.
Sentindo o bom momento, ele investiu na música: "Comecei a encher o saco do Kond (o diretor de clipes Kondzilla), atropelei o calendário dele para gravar logo", diz Kekel. Foi o diretor que deu a ideia de mudar o título da faixa para "Amor de verdade" ("um nome mais responsa", diz Kekel).

Crianças adultas

As trajetórias de Kekel e Rita antes de "Amor de verdade" têm uma coincidência: ambos ficaram sem o pai e a mãe na adolescência, e tiveram que se virar sozinhos em casa.
Aos 14 anos, Rita teve que cuidar dos quatro irmãos mais novos, pois a mãe e o pai abandonaram a casa. Ela diz que presenciava brigas e ameaças. A mãe só voltou dois anos depois - se casou de novo e hoje Rita, aos 18 anos, mora com ela, os irmãos e o padrasto.
Entre os 14 e os 16, quando virou "mãe" dos irmãos, Rita se afastou da música e teve que sair da escola. Aos 10, ela tinha começado a cantar em uma igreja evangélica. "Falaram que eu tinha o dom de Deus para cantar", ela lembra. Ela se espelhava na cantora gospel Bruna Karla.
Após o alívio do retorno da mãe, a voz de Rita de Cassia da Silva Nascimento foi descoberta por produtores de funk, e assim ela virou MC Rita.
Kekel também ficou sozinho aos 16 anos, quando a mãe teve um AVC e morreu. O pai não era presente. A irmã, um ano mais velha, cuidava da casa, e Kekel trabalhava fora: foi servente de pedreiro, estoquista e porteiro. "Era só nós dois", lembra.

Claudinho, Buchecha e Ferrugem

Hoje, Kekel se prepara para lançar um funk com Ludmilla e um reggaeton bilíngue, com um cantor latino famoso ("Quem?" "Não lembro o nome"). Mas sua principal referência na música continua sendo o funk melody de Claudinho e Buchecha.
Enquanto o colega assume a dupla personalidade artística, Rita quer investir no só romantismo "light" mesmo. Além de Bruna Karla, ela gosta de ouvir Marília Mendonça.
"Funk putaria eu não gosto não. Acho que Deus me deu um dom, e eu não gosto de apelar para a sexualidade", ela diz.
Entre os músicos que os dois admiram, o único em comum é o pagodeiro Ferrugem (mais um sinal da "pagodização" do funk).
Kekel tenta explicar a mistura de gêneros e solta uma frase com a mesma espontaneidade de um batuque no armário: "Todo tipo de música é bom.

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